Pesquisador Marcelo Badaró Mattos aborda “a conjuntura brasileira atual e os desafios para a classe trabalhadora”
A convite da Associação dos
Docentes da Uespi (Adcesp), o Fórum Pelos Direitos e Liberdades Democráticas
fez unidade para promover uma palestra com o professor Marcelo Badaró Mattos no
mês de novembro. Marcelo Badaró é pesquisador e docente titular da Universidade
Federal Fluminense (UFF), autor do livro “A Classe trabalhadora: de Marx ao
nosso tempo” bem como de outros títulos importantes. Em sua visita à Teresina
ele falou sobre os caminhos de suas pesquisas, as experiências sindicais e das
organizações a classe trabalhadora dos anos 1980 aos dias atuais e comentou
sobre os principais desafios diante de uma conjuntura de retirada de direitos e
ataques contra a classe trabalhadora.
Como foi o início do seu percurso nos estudos onde você aborda,
principalmente, temas relacionados com a história social do trabalho?
Nós vivemos um período de
ascensão das lutas da classe trabalhadora. Então no fim da década de 1980 o
tema era cotidiano na vida social do país considerando o processo de redemocratização
e o fim da ditadura militar. Como estudante, depois como professor, eu sempre tive
contato com as atividades sindicais e nos últimos 30 anos é isso que tenho
feito.
Você também tem uma atuação política militante para além dos trabalhos
como docente, pesquisador. Já sofreu algum tipo de perseguição por conta dessas
atividades?
Não sofri censuras ao meu
trabalho na universidade como professor da UFF e nem pelo tipo de trabalho que
eu faço. Acredito que isso tem muito a ver também com quem são os estudantes,
das condições que são criadas no ambiente para resistir a isso. São coisas que
tem acontecido muito na rede básica de ensino onde professores são vítimas de
perseguições. Isso tudo faz parte mais de fora para dentro da escola e, de
fato, estamos em um momento obscurantista, de anti-educação, anti-conhecimento,
contra a ciência, antirracionalidade. Isso tem ocupado um espaço cada vez
maior.
Como as organizações da classe trabalhadora podem atuar diante de um
cenário de enfraquecimento desses mecanismos? Você concorda com essa leitura?
Vivemos em um momento de profunda crise dos projetos e das formas tradicionais de organização
e dos projetos políticos construídos pelas forças da classe trabalhadora no Brasil.
De lá até agora passamos por ciclos
até de refluxo das lutas sindicais a
partir de 1990. Destaco que em 1989 tivemos cerca de 4 mil greves e esse número
caiu para cerca de 800 greves na
década seguinte e, nos anos 2000, não
houve recuperação do movimento
sindical e das lutas da classe
trabalhadora, embora, do ponto de
vista político, são momentos
diferentes. Nos anos 1990 as lutas
tinham muito a ver com a
reestruturação econômica e uma tentativa do capital de superar sua crise que gerou
desemprego em massa, desemprego estrutural, repressão, greves duramente reprimidas.
Embora não tenha existido uma ruptura completa com a política anterior, nos
anos 2000 e a partir de 2003 o caminho entre o estado e as organizações da
classe foi diferente. Observamos uma linha de conciliação de classe através do
mecanismo do estado em estabelecer espaços de negociação entre empresários,
trabalhadores e o governo.
Saímos de uma fase mais repressiva para uma fase de apassivamento e depois de par ticipação
controlada, com apoio e submissão da
maioria das organizações ao governo. As greves voltaram a crescer a partir de 2012, 2013 com um salto, mas as lutas continuaram mais na defensiva do que em busca de novos direitos. Eu entendo que no Brasil dos anos 1990 houve um agressivo movimento de
retirada de direitos mas que não
chegou ao patamar de agora. Embora
as forças esti vessem mais frágeis, elas ainda moveram lutas e barraram projetos radicais a exemplo da reforma trabalhista proposta no final do governo de Fernando Henrique Cardoso. Atualmente o desmonte da legislação trabalhista
já mostrar seus efeitos com
desemprego elevado e com a abertura
de vagas de trabalho voltadas ao
setor informal. No governo de Temer
veio a terceirização, menos salários, jornadas maiores, mais riscos de acidentes
de trabalho, demissões sem direitos.
É uma política econômica maia
agressiva que já se faz sentir com o
aumento exponencial da miséria e
dificultando a sobrevivência da maioria da população. Se paramos para pensar a Constituição de 1988, veremos como ela refletiu o crescimento das mobilizações da classe no período de redemocratização,
ela incorporou novos direitos,
depois as lutas que vieram foram
todas contra a retirada de direitos.
No plano do serviço público os
trabalhadores saíram em defesa da
educação, da saúde, de seus
direitos. No plano privado aconteceram
greves de trabalhadores terceirizados. Embora vejamos um ciclo de retomada
de lutas, elas ficaram na defesa dos
direitos e, além disso, muitas greves se fizeram contra as direções sindicais mas com
apoio das bases.
Então quais os desafios colocados?
Tem muitos desafios colocados
hoje. Dentre eles está o grau de precarização das relações de trabalho, nas
dinâmicas dos sindicatos, na criação de frentes com movimentos sociais mais
amplos, na classe que está muito fragmentada. Há novas formas de exploração e
muito radicais, sem contratos, com jornadas elevadas – a chamada uberização,
lutas por moradia, educação pública, saúde, transporte, contra a violência
policial nas periferias e favelas. É necessária a retomada de uma perspectiva
de confronto como das lutas que ascenderam como nos anos 1980. Precisamos
colocar as forças existentes nas ruas e tomar os exemplos da América Latina
como inspiração, pois a sensação da população é de que as políticas neoliberais
chegaram a um beco sem saída, levando as pessoas às ruas contra reformas do
tipo trabalhista, que promove aumento de preços nos gêneros básicos, reforma da
previdência, contra a miséria absoluta da população mais velha. Isso são
resultados nefastos das política neoliberais. Não há margem para negociação com
o grande capital pois eles tem avançado contra nossos direitos. Não cabe mais
só a luta institucional meramente para superar a situação atual.
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